O que é o Acolhimento Familiar (AF) e porque é necessário?
Portugal está
dotado em termos legais de um mecanismo ponderado de proteção e promoção de menores
em perigo que inclui o acolhimento temporário, de uma criança ou jovem até aos
18 anos, numa família de acolhimento, aquando
da necessária retirada da sua família de origem. Especifica-se aqui a Lei nº
147/99, de 1 de setembro, Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo,
e subsequentes alterações, tendo sido a medida de acolhimento familiar regulamentada
pelo Decreto-lei nº 11/2008, de 17 de Janeiro, que estabelece o
regime de execução do acolhimento familiar previsto na lei de protecção de crianças
e jovens em perigo. Posteriormente, através da Lei nº 142/2015, de 8 de
setembro, o legislador procedeu à alteração à Lei de Proteção de Crianças e
Jovens em Perigo, concebendo o acolhimento familiar como uma medida cuja
execução deve ser perspetivada de forma integrada atendendo ao superior
interesse da criança.
Mais recentemente, a lei Portuguesa voltou a privilegiar o acolhimento familiar ao acolhimento residencial para crianças ou jovens dele necessitados aquando em situações de perigo, particularmente para crianças menores de 6 anos, mas, novamente, em qualquer idade até à maioridade. Especifica-se, aqui, o Decreto-Lei nº139/2019, de 16 de setembro, que estabelece o regime de execução do acolhimento familiar, e a sua Portaria nº 278-A/2020, de 4 de dezembro, que define os termos, condições e procedimentos do processo de candidatura, seleção, formação e avaliação das famílias de acolhimento, bem como o respetivo reconhecimento.
Em sumula, o AF constitui-se uma “medida de protecção para crianças e jovens (...) que se encontrem numa condição de vulnerabilidade e cujos direitos, num determinado momento, podem estar seriamente comprometidos”, ou seja, “é uma medida de promoção e protecção, para garantir transitória e temporariamente um enquadramento à criança ou jovem em perigo, que permita minimizar os efeitos da separação do seu agregado de origem. Esta medida pressupõe a previsibilidade de retorno da criança ou jovem ao meio natural de vida” (in “Acolhimento Familiar - Manual de Processos-Chave” do Instituto da Segurança Social).
A investigação na área indica que os cuidados providenciados pelo/no AF, o conceito e vivência de família numa família para isso selecionada e capacitada, proporcionarão à criança ou jovem um maior nível de habilidades e capacidades que serão fundamentais para o seu pleno desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e psicossocial, quando comparado com o acolhimento residencial (e como tal preferencial a). A Teoria do Desenvolvimento Psicossocial de Erik Erikson claramente indica que o crescimento psicológico ao longo do ciclo de vida ocorre através de estágios e fases e depende da interação da pessoa com o meio que a rodeia. Porém, em Portugal o acolhimento residencial é largamente privilegiado – cerca de 97% das crianças ou jovens em perigo são colocadas em acolhimento residencial (Relatórios CASA). Esta é uma realidade distinta de outros países europeus, onde os números estão frequentemente invertidos – ou seja, apenas 3 em cada 100 crianças em acolhimento residencial versus familiar. Assim, urge a promoção e compreensão do que é o acolhimento familiar e a, correspondente, sensibilização para este.
Qual o trajeto até uma criança ou jovem chegar a Acolhimento Familiar (AF)?
Sumariamente, o processo é despoletado por uma sinalização a uma Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) ou queixa a Tribunal. Subsequentemente, na CPCJ um gestor(a) de caso pode, então, decidir a via de AF, mas tem que existir a concordância dos pais e da criança se esta tiver 13 ou mais anos. Se os pais não derem consentimento poderá haver um envio por parte de técnico(a) da CPCJ da medida para Tribunal. No caso da sinalização ao Tribunal, depois do promotor investigar é decidido se prossegue ou não em Tribunal (e o mesmo acontece com os casos que provenham das CPCJ). Se prosseguir, é então tomada uma decisão pelo juíz(a). Uma Equipa Multidisciplinar de Assessoria aos Tribunais (EMAT) poderá ainda atuar a partir do momento em que é feita a denúncia ao Tribunal. Um jovem ou criança poderá, também, sair de Acolhimento Residencial (AR) ou/para AF.
A decisão de se encaminhar
para AR ou AF poderá ainda ser uma decisão da gestão de vagas caso venham da
CPCJ. Ou seja, o(a) juiz(a) pode decidir enviar para AF mas é a gestão de vagas
que impacta na decisão de que família. Esta parte do processo já é também
trabalhado junto das instituições de gestão e/ou de enquadramento das famílias
de acolhimento, em que toma também relevância o perfil ou características das
famílias disponíveis em “bolsa (e/ou carteira) de famílias”. Num passo final, a
família de acolhimento, em bolsa de famílias e devidamente caracterizada,
formada, e certificada, poderá ou não indicar concordância ao acolhimento da
criança ou jovem em específico.